Dos transportes ao lazer, as ferramentas de dados dizem "como a rua está a ser utilizada"

Nos últimos cinco anos, um grupo de 19 investigadores estudou estratégias sobre como a utilização das ruas pode ser analisada, tentando perceber o seu potencial de transformação, mesmo que apenas em algumas partes do dia. Uma responsável da Câmara de Loures reconhece que seria útil na mobilidade do concelho.

Gonçalo Costa Martins - Antena 1 /
Campo Grande, Lisboa Foto arquivo: Gonçalo Costa Martins - Antena 1

Chamam-lhe “realocação dinâmica”: atribuir diferentes funções às ruas ao longo do dia. Se nas horas de ponta o trânsito pode ser mais intenso, essas ruas podem contemplar espaço para ciclovias ao final da tarde ou esplanadas à noite.

Apresentados os resultados finais esta sexta-feira, o projeto “Streets 4 All” (Ruas para todos), que junta o Instituto Superior Técnico (IST) e a Universidade de Coimbra, propõe usar a tecnologia para avaliar e pôr em prática estas alterações no espaço urbano.

“A análise é feita de formas mais convencionais, como observação direta e questionários às pessoas que andam na rua, ou de formas mais tecnológicas, recorrendo à interpretação de vídeos, fotografias, sensorizações que as pessoas trazem no bolso como ao telemóvel”, explica Filipe Moura, um dos responsáveis do projeto e professor no IST.

Afirma que daí é possível “retirar indicadores que nos vão dizer em várias horas do dia como é que a rua está a ser utilizada”.
Reportagem do "Portugal em Direto" | Filipe Moura (à esquerda) e Gabriel Valença (à direita)
Ferramentas de dados ajudariam a "dar prioridade aos transportes"
A utilização de ferramentas que compilam dados permitem analisar e compreender padrões no território, podendo ajudar a tomar decisões nas políticas públicas.

Acho que este trabalho é absolutamente aquilo que eles estão à procura”, diz Filipe Moura referindo-se às autarquias. Permite “quase à distância de um clique fazer emergir as zonas onde seja interessante pensar no problema e depois ir lá a ver o que é que é preciso fazer”, aponta.

Do lado das autarquias, há quem reconheça esta importância e que seria possível fazer melhores políticas públicas. Numa plateia de estudantes e académicos a assistir às apresentações no Caleidoscópio, em Lisboa, a Antena 1 encontrou uma responsável de uma câmara municipal.

Paula Pereira é chefe da divisão de mobilidade da Câmara Municipal de Loures. A autarquia tem um sistema de informação geográfica com dados de base e cartografia própria, mas reconhece que em novas ferramentas e com sensores “ainda estamos a dar os primeiros passos”.

“Eu acho que a grande vantagem é dar uma resposta célere às necessidades dos munícipes”, diz Pereira, defendendo também que estas tecnologias permitiriam colmatar saídas de funcionários e facilitariam “ter tempo para tomar decisões já com a informação trabalhada, sem nos dar esse trabalho de preparar os dados”.

Conclui que “termos ferramentas que nos agilizem os processos é muito importante”
Posters de trabalhos no âmbito do projeto "Streets 4 All", afixados no Caleidoscópio, em Lisboa

No caso da sua área, Paula refere que seria importante para a Câmara de Loures ter uma ferramenta que permita verificar “quais eram os corredores viários onde poderíamos implementar faixas bus”, como foi mostrado na apresentação do projeto.

“Isso para nós era uma coisa muito importante, para dar prioridade aos transportes e ver se a gente começa a pôr os transportes a funcionar de forma mais célebre”, explica, dado que “as viagens de carro são mais rápidas do que de autocarro” havendo também “muitos carros na rua e portanto temos que dar velocidade aos autocarros”.

Sobre projetos de corredores concretos em Loures, Paula Pereira não tinha algum concreto em mente e explica que esse tem sido um trabalho em curso com os Transportes Metropolitanos de Lisboa (responsável pela marca de autocarros Carris Metropolitana).
Excerto das declarações de Paula Pereira à Antena 1 Rua Morais Soares. A caminho do trabalho “as pessoas já esperam mais poluição”
Entre cerca de 20 locais de Lisboa que foram estudados (havendo mais também em Coimbra), foi feito um inquérito na Rua Morais Soares, que fica na freguesia de Arroios, em Lisboa.

O objetivo era pedir-lhes a perceção que tinham da rua através das perguntas feitas entre as 8 horas e as 20 horas, perguntas feitas a moradores, comerciantes ou pessoas que estavam apenas de passagem.

“Uma das principais conclusões que tivemos foi que as pessoas têm a perceção que muda ao decorrer do dia”, afirma Gabriel Valença, professor do IST e um dos investigadores do projeto.

Durante as horas de ponta, “as pessoas estão andando para o trabalho e portanto talvez já esperam ter mais poluição”, refere, mas nas restantes horas "estão utilizando as esplanadas, utilizando a rua de uma forma diferente” pelo que “a perceção de poluição nessa rua é pior durante esse período”.

O excesso de lixo foi apontado como a principal barreira pelos inquiridos, enquanto o volume de trânsito e o estacionamento abusivo foram consideradas barreiras persistentes ao longo do dia.
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